Antonio Candido (Rio de Janeiro/RJ, 1918) é autor de obras que combinam a interpretação de literatura e sociedade por meio de um método de estudo por ele nomeado como crítica integradora. Um método histórico e literário que permite estudar como o texto literário recria e expõe a realidade social nas tintas e no papel da ficção, com o objetivo de compreender como o contexto foi transformado e reduzido estruturalmente no texto, necessitando, portanto, de análise e interpretação pela crítica literária e pelo pensamento social.
Ingressou na USP em 1939 como estudante de Ciências Sociais e Política. Mais tarde, faria carreira na instituição, como assistente e professor da cadeira de Sociologia e, depois, professor de Teoria Literária e Literatura Comparada. Atuou na cultura como um dos criadores da Revista Clima (1941-1944), e na política como fundador dos Partidos Socialista (1947) e dos Trabalhadores (1980).
Embora a crítica integradora seja histórica e literária, a literatura possui a primazia do conhecimento da realidade, pois representa ela mesma a história. Para Candido, importa o estudo da literatura em si, isto é, o modo como o texto recriou a realidade esteticamente, um fenômeno conhecido como “redução formal” ou “estrutural” dos dados sociais externos. Não interessa a interface do texto com a sociedade, mas como esta foi transformada em texto, devido ao processo de redução. É um complexo método dialético, que Candido ousou assim explicar: “A minha fórmula é a seguinte: estou interessado em saber como o externo se transformou em interno, como aquilo que é carne de vaca vira croquete. O croquete não é vaca, mas sem a vaca o croquete não existe. Mas o croquete não tem nada a ver com a vaca, só a carne. Mas o externo se transformou em algo que é interno. Aí tenho que estudar o croquete, dizer de onde ele veio” (Entrevista ao jornal Brasil de Fato, 30/06/2011 – 06/07/2011, p. 4). Essa resposta bem-humorada é um exemplo dos atributos que podem ser encontrados em seus ensaios e escritos críticos: a capacidade de criar e/ou traduzir sofisticados sistemas de pensamento em palavras acessíveis e disponíveis para o leitor. No entanto, a crítica integradora depende de outro componente para funcionar: o sistema literário, formado pela tríade autor-obra-público. É através desse sistema que temos acesso à sociedade internalizada ou reduzida estruturalmente na obra literária. Mas há problemas a enfrentar. Além da dificuldade de compreender cada um desses elementos da tríade, há momentos em que um deles pode não se apresentar; como é o caso do público leitor. Assim, se tomarmos o exemplo da história da literatura brasileira, vemos que houve momentos em que existia uma grande produção literária, como no romantismo com José de Alencar (O Guarani), Joaquim Manuel de Macedo (A moreninha), Manuel Antonio de Almeida (Memórias de um sargento de milícias). Todavia, segundo Candido, nessa época o público era restrito ou reduzido a uma camada específica da população – a elite. Baseado nisso, a literatura tinha uma realização ou existência parcial, pois não era conhecida pela totalidade da população. A escravidão e o analfabetismo eram problemas estruturais, colocando um desafio para a formação do sistema literário. Trata-se de um momento de crise da sociedade brasileira que Candido enfrentará escrevendo importantes obras de crítica literária e de sociologia, tais como A formação da literatura brasileira (1959); Literatura e Sociedade (1965) e O discurso e a cidade (1993). Essas e outras obras estão pautadas pela análise crítica das crises que estruturam a formação da sociedade brasileira, como ocorre, também, em Os parceiros do Rio Bonito (1954). Sociologia e Crítica Literária compõem um repertório analítico que tem na crítica e na crise palavras-chave que colaboram para que o leitor adentre o universo de literatura e sociedade criado por Candido, permitindo o estudo dos problemas decisivos da sociedade brasileira e que aparecem refratados na ficção brasileira.
Sugestões de leitura:
Candido, Antonio. Iniciação à literatura brasileira: resumo para principiantes, 3º edição, São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 1999.
Entrevista: Antonio Candido, “O socialismo é uma doutrina triunfante”. Brasil de Fato, Ano 9, Número 435, São Paulo, 30/06/2011 a 06/06/2011.
Esboço de Figura: homenagem a Antonio Candido, São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1979.
Pontes, Heloísa. “Entrevista com Antonio Candido”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, Volume 16, Número 47, São Paulo, Outubro/2001.
___. Destinos mistos. Os críticos do grupo Clima em São Paulo (1940-1968). São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
Waizbort, Leopoldo, A passagem do três ao um: crítica literária, sociologia, filologia, São Paulo: Cosac Naify, 2007.